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La insignia
18 de maio de 2007


O maior dos conjuntos vocais


Luís Nassif
La Insignia. Brasil, maio de 2007.


As vozes estão algo cansadas, algumas um pouco envelhecidas, mas o som ainda é surpreendentemente moderno. Quem nunca ouviu falar do conjunto vocal "Os Cariocas", assistisse suas apresentações atuais mas, especialmente, ouvisse as velhas regravações poderia imaginar que é um filho da revolução vocal que produziu, entre outros, o americano "Take Six". Mas o conjunto é mais antigo e a parte mais criativa, com arranjos vocais sem paralelo na história da música brasileira, é dos anos 40 a 60.

O país já tinha uma boa tradição de grupo vocal. Nos anos 30 surgiram os pioneiros "O Bando dos Tangarás" (de Braguinha, Almirante e Noel), "O Bando da Lua" (de Badeco, Aloísio de Oliveira) -com muita ênfase instrumental. Nos anos 40 e 50 brilharam "Os Anjos do Inferno" -com seu esplêndido "crooner" Léo Villar--, "Quatro Azes e Um Curinga", "Quintandinha's Serenaders", "Demônio da Garoa", "Quarteto X", "Garotos da Lua", "Namorados da Lua".

Mas como "Os Cariocas", nenhum. Eles surgiram após os "Anjos do Inferno" e antes do "Quarteto" (excepcional conjunto de vida curta de meados dos anos 60) e do MPB4 -o conjunto vocal que domina a cena de meados dos anos 60 a 70.

Eu peguei a rebarba, o período bossa-nova deles. Mas a vanguarda vinha de antes. O conjunto foi criado por Ismael Neto nos anos 40 no bairro da Tijuca. Os arranjos tomavam por base os naipes das bandas americanas da época, harmonizados em quatro ou cinco vozes. Os melhores conjuntos da época não avançavam além de três vozes.

Quando começou o sucesso, o grupo era composto por Ismael Neto, arranjador, primeira voz e violão, Severino Filho, segunda voz e percussão; Emmanoel Furtado, o Badeco, terceira voz e violão, Waldir Viviani, solista, percussão e quinta voz e Jorge Quartarone, o Quartera, quarta voz e percussão.

Seu primeiro disco em 78 rotações tinha "Adeus América", de Haroldo Barbosa e Geraldo Jacques e "Nova Ilusão", de José Menezes e Luiz Bittencourt, dois clássicos irretocáveis do período.

Até meados dos anos 50, bebendo no repertório balançado dos anos 40, naquele grupo de compositores de elite como Haroldo Barbosa, Alcyr Pires Vermelho, Wilson Batista, "Os Cariocas" ajudaram na passagem do sincopado para a bossa-nova -algo que seria completado, anos depois, por João Gilberto.

Sua fase pré-bossa foi um banho de irreverência, balanço, harmonização, sofisticação, como em "Cadê Jane", de Wilson Batista e Erasmo Silva, o "Neurastênico" (Betinho e Nazareno de Brito, sucesso na voz dos Trigêmeos Vocalistas), o "Qui Nem Jiló" (Luiz Gonzaga), que gravaram ao lado de Marlene. E, especialmente, as composições de seu líder, Ismael Neto. Compositor dos mais inspirados, antes de falecer, em 1956, deixou vários clássicos, o maior dos quais foi a "Valsa de uma Cidade", em parceria com Antonio Maria, a mais bela homenagem que o Rio de Janeiro já recebeu. Foi dessa fase inicial a gravação de "Tim-tim por tim-tim", também de Barbosa e Jacques, com o espírito da bossa nova já totalmente encarnado. A música seria, depois, regravada por João Gilberto.

Após a morte de Ismael, Severino Filho assumiu seu lugar, depois de ter passado pelos cursos de Joachim Koelreuter, e não deixou a peteca cair. Aliás, o maestro é mais conhecido por ter introduzido o atonalismo na música brasileira e pelas enormes polêmicas que manteve com os compositores nacionalistas (Camargo Guarnieri à frente). Mas por suas mãos passaram os maiores instrumentistas populares do período, de Severino a Cazé, de K-Ximbinho a Tom Jobim.

Até então, a primeira voz em falsete era feita por Ismael. Seu lugar foi ocupado por Hortência Silva, suja irmã. Em 1959 saiu Hortênsia, e Severino assumiu a voz de falsete. Em 1962 participaram da histórica temporada no "Au Bom Gourmet", ao lado de Tom Jobim, Vinicius de Moraes e João Gilberto, temporada marcante para a bossa nova e para o grupo, com a incorporação do Luiz Roberto, uma de suas mais belas vozes.

Dali para frente, "Os Cariocas" se tornariam o vocal símbolo não apenas da bossa-nova, mas o mais sofisticado som vocal que esse país de mil vozes já pode ouvir.

Longa vida a Severino Filho.



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