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La insignia
14 de janeiro de 2006


Visconti, o aristocrata do cinema


Lluís Bonet Mojica
Gramsci e o Brasil / La Insignia*. Brasil, janeiro de 2006.

Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves


Rocco e seus irmãos

Ele assumiu como nenhum outro cineasta a contradição do artista que indaga e nunca se dá por satisfeito. Combinou as condições de aristocrata e marxista.

Considerava-se um homem mais de teatro que de cinema. Sempre viveu obcecado pela recordação de sua mãe (apesar de seu irmão mais velho ser o predileto dela), cuja morte prematura talvez tenha impossibilitado a idéia de repetir uma relação semelhante com outra mulher. Soube assumir sua homossexualidade e uma decadência pessoal e até criativa, da qual impregnou seus filmes.

Luchino Visconti, conde de Modrone, nasceu em Milão em 2 de novembro de 1906. Morreu em Roma em 17 de março de 1976. Dois dias depois foi celebrado um duplo funeral, laico e religioso. Milhares de pessoas, na maioria portando bandeiras vermelhas, se reuniram na bela praça romana onde fica a Igreja de Santo Inácio. O diretor Francesco Rossi, outro expoente da esquerda, foi um dos que pronunciaram um breve discurso. Participaram da cerimônia religiosa o presidente da República Italiana, Giovanni Leone, e o secretário-geral do PCI, Enrico Berlinger.

Para o autor Rafael Miret Jorba, que escreveu em 1984 Luchino Visconti, a razão e a paixão, "o duplo enterro, religioso e civil, constitui a última expressão da contradição que caracterizou sua vida". Visconti havia manifestado em alguma ocasião o desejo de que "em minha tumba se grave: 'Adorava Shakespeare, Tchekov e Verdi'".

O que foi cumprido, pois ele mesmo havia desenhado de maneira minuciosa sua última e definitiva entrada em cena, foi a colocação das cinzas em uma urna que, segundo seu desejo, foi depositada sob uma pedra da ilha de Ischia. Contam que o manuscrito de suas memórias ficou pudicamente fechado no escritório de seu apartamento em Roma.

O cineasta afirmava que o final de O leopardo, sem dúvida seu clímax artístico, "me lembra o fim dos bailes na casa de minha infância". Luchino Visconti vinha de um mundo exclusivo, onde sua classe social tinha direito ao melhor e mais seleto. O problema estava em aproveitar esses privilégios ou desperdiçá-los. Quando menino, Luchino descobriu a ópera no Scala de Milão, então sob a direção de Toscanini. Em 1927 entrou para o regimento de cavalaria Sabóia e foi um sargento temido pelos soldados. No futuro colaboraria com a Resistência e esteve prestes a ser fuzilado, salvando sua vida graças à chegada das tropas aliadas.

Sua vida mudaria no dia "em que percebi que minha paixão pelos cavalos já não me satisfazia. Senti a necessidade de me dedicar a outras atividades e vendi meus cavalos para ir a Paris". Naquela Paris dos anos 30 conheceu Coco Chanel, famosa estilista de moda de quem sua mãe havia sido cliente, que o introduziu numa arte que fascinava os artistas da época: o cinema.

Ela o pôs em contato com outro grande diretor de esquerda, Jean Renoir, do qual Visconti foi assistente de direção em Toni (1935), embora não apareça nos créditos, e em Une partie de campagne, indiscutível obra-prima do cineasta francês. Visconti reconhecia que em Paris havia descoberto seu futuro profissional e político imediato: "Todo o grupo em torno de Renoir era comunista... Começaram a me fazer entender e ver certas coisas".

Em 1943 estréia na direção com Obsessão, adaptação pessoal - sem pagar direitos - do famoso romance de James M. Cain O carteiro toca sempre duas vezes. Cinco anos depois filma A terra treme, protagonizada não por atores, mas por pescadores e moradores da região, aos quais toda manhã explicava o plano de filmagem, deixando-lhes uma ampla margem de improvisação nos diálogos.

Depois viria Belísima, com sua amada e odiada Anna Magnani, que retornaria em um episódio de Nós, as mulheres. Em 1954 filma Sedução da carne (onde contaria como ajudantes com nada menos que Francesco Rossi e Franco Zeffirelli), melodrama amoroso singular interpretado por Alida Valli e pelo ator americano Farley Granger, que três anos antes tinha atuado sob as ordens de Hitchcock em Pacto sinistro.

Em Um rosto na noite lançaria definitivamente um ator inesquecível, Marcello Mastroianni, ao mesmo tempo que pôde trabalhar com o francês Jean Marais, amante de Jean Cocteau. Mas seu primeiro grande êxito comercial e também artístico chega em 1961, com Rocco e seus irmãos, que trata de um tema tão atual hoje quanto a exploração do proletariado imigrante.

A maior obra de Visconti é sem dúvida O leopardo (1963), que recupera o genial romance de Giuseppe Tomasi Di Lampedusa. Depois de Sandra, seu único filme protagonizado por uma mulher (Claudia Cardinale), se seguirão O estrangeiro (adaptação do romance de Camus) e Os deuses malditos, retrato do nazismo ascendente, em que o ator austríaco Helmut Berger (que ele já havia dirigido em um episódio do filme coletivo As bruxas, onde também intervinha Francisco Rabal) se transforma em seu amante e ator fetiche. O singular Morte em Veneza precede o wagneriano Ludwig, cuja antiga versão de quatro horas foi recuperada em 1980.


(*) Publicado originalmente em espanhol no jornal La Vanguardia.



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