Portada de La Insignia

27 de agosto de 2007

enviar imprimir Navegación

 

 

Sociedad

O perigo do negacionismo


Luís Carlos Lopes
La Insignia, agosto de 2007.

 

O negacionismo 'clássico' é um procedimento usual da extrema direita. Seus partidários em vários países negam que tenha existido a solução final na Alemanha nazista. O extermínio massivo de milhões de seres humanos é negado. Não teria havido um plano ou não teriam existido os instrumentos criados para provocar a morte de pessoas recolhidas aos campos de concentração. Negam, igualmente, a escravidão recriada no mesmo país, para sustentar a indústria de guerra. Negam fatos que os colocam na posição de partidários dos maiores genocidas na história humana. Dizem que nada disto existiu nos termos conhecidos, e que tudo o que é dito não passa de propaganda. As imagens dos fornos crematórios seriam montagens fotográficas ou filmográficas. Os depoimentos registrados em inúmeras mídias seriam mentiras orquestradas pelos judeus e pelo comunismo.

O negacionismo atual tem múltiplas faces e não é mais monopólio da extrema direita. Ela continua a praticá-lo sistematicamente por toda parte, mas as outras direitas -existem múltiplas direitas- também fazem uso do mesmo procedimento. Tornou-se fácil no mundo do espetáculo midiático proceder assim. Os meios disponíveis para a propaganda política e a manipulação social devem ser invejados, se vistos do inferno. Goebels, ministro da propaganda de Hitler, deve lamentar ter vivido em uma época onde as mídias eram de alcance tão limitado. Na época do nazismo não havia televisão, Internet etc. O Mein Kampf, livro de base do hitlerismo, alcançou, na época, uma edição de cerca de um milhão de exemplares. Hoje, qualquer besteira livresca que venda no mundo, consegue tiragens de milhões e milhões nas mais diversas línguas.

Os inimigos de hoje não são exatamente os mesmos. O que se precisa negar também não é necessariamente a mesma coisa. Negam-se, por exemplo, a guerra do Vietnã e seus horrores, as tragédias perpetradas pelo fascismo vermelho de Stalin, os genocídios e limpezas étnicas dos Bálcãs e da África etc. Nega-se a truculência das ditaduras militares latino-americanas, representadas pela tortura, morte, exílio e censura. Negam-se todas as ignomínias perpetradas contra o gênero humano.

Continua-se, outrossim, a se negar que houve e continua a existir violências, discriminações, racismos, exclusões e preconceitos. Os seres humanos, pertencentes à grande família do homo sapiens, persistem sendo vistos por alguns, como se fossem de diferentes espécies. Confunde-se, deliberadamente, diferenças com oposições fratricidas, tais como as expostas no integrismo puritano e racista e nos fundamentalismos religiosos em voga.

Uma nova mania negacionista, que beira a paranóia, é a de acreditar na teoria conspirativa que imagina a manipulação midiática como algo infinitamente mais forte do que os episódios reais. É verdade que as mídias, sobretudo as empresariais e mais estruturados, manipulam, mentem e tentam controlar a opinião comum. Mas, também é verdadeiro que elas têm limites e precisam se basear, vez por outra, em fatos concretos, como, por exemplo, a crise aérea e os episódios recentes da longa história brasileira da corrupção de Estado.

Uma das vertentes políticas contemporâneas da chamada cultura das mídias é o negacionismo clássico. Outra consiste no negacionismo que foi refundado no mundo atual. A construção das 'verdades' midiáticas baseia-se na verossimilhança, isto é, em algo plausível e possível de ser concreto e, por isso, consistindo em fácil objeto de manipulação. Os grandes veículos precisam se apropriar da realidade e dar a ela um sentido que lhe interesse, fugindo da objetividade que, paradoxalmente, dizem perseguir. Entretanto, é mais raro, no contexto da democracia, dizer algo absolutamente impossível, tal como se fazia na época da ditadura.

O convencimento, quando fruto da manipulação, almejado pelas grandes mídias, precisa se ancorar em algo visível e que não possa ser facilmente desmascarado. A notícia e a opinião são construídas de modo cauteloso. Os fatos reais são narrados a partir de uma ótica de preconceitos e interesses que ressaltam ou escondem, tal como é necessário para se construir os artefatos e a opinião do público receptor. Por isso tudo, também é caracterizável como negacionismo dizer que as grandes mídias falam absolutas inverdades, em todos os casos e em qualquer situação. Nem o ministério da propaganda da Alemanha nazista agia assim. É preciso cautela com o exagero da simplificação.

É importante denunciar todas as imposturas históricas e reconstruções manipuladas que servem à formação da opinião comum. Talvez, assim, os negacionistas tenham maior cuidado. Eles são seres das sombras. Detestam que se faça a exposição de suas mazelas. Abominam que se fale sobre o que não podem responder, e sobre o que querem esconder. Temem o debate, em especial, com quem não tem o rabo preso em algum lugar.

 

Portada | Mapa del sitio | La Insignia | Colaboraciones | Proyecto | Buscador | RSS | Correo | Enlaces