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La insignia
2 de dezembro de 2006


O naufrágio


Luís Carlos Lopes
La Insignia. Brasil, dezembro de 2006.


Há momentos que nos sentimos como náufragos. Estamos à deriva agarrados a algo que flutue. Nesta precária situação, escrevemos e jogamos garrafas ao mar, tentando comunicar o nosso modo particular de ver o mundo. Não temos nenhuma certeza de que seremos lidos, compreendidos e que a mensagem servirá a alguém. Simplesmente, jogamos as garrafas com os textos retirados de nossos sangues. Há um certo alívio em proceder assim. Parece que extirpamos nossos males e nos sentimos melhor.

É verdade que gostamos de irritar os fariseus, de dizer que a verdade não é perfeita e que o formato esférico da Terra é irregular. Temos prazer, quando alguns nos entendem e nos complementam. Achamos graça quando nos compreendem no sentido inverso do que dissemos. Não há jeito para isto, disso sabemos. As pessoas compreendem o mundo a partir do que são e não do que gostaríamos que fossem. Cabe a elas julgar o que escrevemos. Não somos proprietários da consciência alheia e, como não somos doutrinários, respeitamos opiniões diferentes das nossas.

Os náufragos sabem que seus movimentos são cruciais. Qualquer deslize e afundam sem poder voltar a respirar. Por vezes, temos vontade de deixar que a natureza se faça. Afundar na imensidão do mar azul tem inúmeras vantagens. Vencemos por exclusão. Ninguém mais poderá nos importunar. A morte não é o fim de tudo e, sim, o começo de novas vidas que virão, de novos náufragos que sobreviverão, e chegarão à terra firme.

A humanidade sobreviveu a todos os naufrágios que lhes foram impostos. Não dá para crer que os que se avizinham também não serão vencidos. Coletivamente tudo se resolve, mesmo que individualmente, alguns conheçam o manto da morte, sem poder ver o que virá a seguir. O remédio é continuar a jogar garrafas, mesmo em mares revoltos e nas coordenadas geográficas mais remotas. Elas serão achadas por alguém e usadas de algum modo.

Por isso continuamos vivos, amando a vida e suas imensas possibilidades. Não há porque afundar, enquanto houver garrafas a lançar ao mar e textos a produzir, tentando contribuir para que o mundo seja mais bem compreendido e coberto pelas melhores qualidades humanas.



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