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La insignia
19 de março de 2004


Ciências no pátio da escola


Felipe A. P. L. Costa (*)
La Insignia. Brasil, março de 2005.


Vida é dinamismo e, em boa medida, movimento. Desse ponto de vista, não é difícil concluir, mesmo para as crianças das séries iniciais do Ensino Fundamental, que os animais estão vivos; afinal, cães, aves e gafanhotos estão por aí, correndo, voando ou saltitando de um lado para outro. Todos vêem que os animais estão vivos; ninguém se espanta, portanto, quando ouve o professor anunciar em sala de aula que os animais são seres vivos. Esse mesmo pragmatismo cognitivo ("seres vivos se movimentam"), no entanto, pode gerar dificuldades quando o tema da aula se volta, digamos, para o estudo dos animais sésseis (esponjas, corais, cracas etc.), organismos que passam a maior parte de suas vidas presos a um substrato.´

"O senhor está falando sério, professor, isso ai na sua mão não é uma pedra?" - perguntas como essa não devem soar estranhas àqueles que decidem mostrar exemplares de algum animal séssil a seus alunos. E como poderia ser diferente? Como uma criança pequena conseguiria diferenciar, por exemplo, o corpo de uma esponja (a rigor, seu esqueleto) de uma escultura em pedra? Assistir a um documentário na TV talvez ajude a dissipar desconfianças, principalmente se as cenas mostradas incluírem movimentos ou ações aparentes desses animais. Muitas dificuldades, no entanto, ainda devem persistir.

A situação é ainda pior quando o tema da aula se volta para os vegetais [1]. Como seria possível, por exemplo, convencer às crianças de que ervas, arbustos e, principalmente, árvores são de fato seres vivos? Afinal, além de duras e aparentemente insensíveis, árvores ficam o tempo todo imóveis, paradas, sem sair do lugar, do mesmo jeito que uma pedra ou uma montanha. E pedras e montanhas evidentemente não estão vivas. O problema torna-se particularmente preocupante quando percebemos que os professores do Ensino Fundamental (mesmo aqueles que tem um diploma universitário) não estão habituados a lidar com plantas vivas de um modo dinâmico. Boa parte disso tem a ver com a própria formação dos professores que trabalham hoje com o Ensino Fundamental.

O ensino de botânica nas universidades brasileiras ainda dá uma ênfase exagerada em aspectos descritivos da disciplina, quase sempre lançando mão de procedimentos destrutivos ou invasivos. Graduandos em Ciências Biológicas, por exemplo, dedicam muito mais tempo a "atividades tanatológicas", manipulando cadáveres de animais e plantas secas, do que a atividades que envolvam mais propriamente a biologia de plantas e animais vivos [2]. Essa situação não melhora muito quando os estudantes vão a campo, onde o trabalho prático tende a se concentrar na coleta de material - i.e., na produção de novos cadáveres. Não é de estranhar, portanto, que esses jovens mais tarde venham a reproduzir com seus próprios alunos a tanatologia que aprenderam nos tempos de graduação.

Mas nada disso tem de ser assim. Ainda estamos no paraíso dos botânicos e reverter essa situação não requer verbas vultuosas nem planos ministeriais mirabolantes. No fim das contas, o que precisamos é sobretudo de conhecimento: o que fazer para converter tanta diversidade biológica em riqueza pedagógica? Pensando nisso, apresento a seguir uma atividade que o professor de Ciências pode desenvolver com seus alunos ao longo do ano. O tipo de atividade proposta se fundamenta na idéia de que estudar o comportamento de seres vivos (plantas e animais) pode ser uma valiosa ferramenta pedagógica e um modo mais efetivo de introduzir o aluno no universo da ciência.

Conduzir atividades práticas muitas vezes significa sair de sala de aula e isso nem sempre é visto com bons olhos pela direção da escola. Nesse ponto, porém, devemos ter em mente que a experiência prática é fundamental no ensino de Ciências, o que não quer dizer, evidentemente, que o professor tenha de levar sua turma para longe, em excursões caras, trabalhosas e demoradas. A horta, o quintal ou mesmo o pátio da escola devem ser mais do que suficientes; de resto, a demanda por equipamentos caros e sofisticados e zero. Na verdade, a maior dificuldade que muitos professores enfrentarão tem a ver mais com a sua própria inexperiência com o estudo não-destrutivo e não-invasivo de organismos vivos; em casos assim, sugiro que o professor teste antes a atividade proposta, em casa ou na própria escola.


Estudando o comportamento das plantas

Um ponto de partida simples, acessível e envolvente é estudar o comportamento de plantas vivas, acompanhando de perto seu crescimento vegetativo (produção de folhas) ou reprodutivo (produção de flores). Se a escola tiver um quintal, com ervas, arbustos ou árvores em crescimento, o cenário já está montado; caso contrário, podemos começar recrutando os alunos para a confecção prévia de vasos que serão utilizados para cultivar mudas de plantas [3].

Para acompanhar o crescimento de plantas individuais, podemos fazer o seguinte:

a) Escolher algumas mudas (digamos, 10, no caso de uma turma com 30 alunos, divididos em 10 grupos com três alunos cada) de uma mesma espécie.

b) Cada uma das muda (cuja altura deve ser compatível com a estatura das crianças, para facilitar a manipulação) deve sustentar um número relativamente pequeno de folhas (digamos, até 10-12 folhas).

c) Duas vezes por semana, cada grupo de alunos deve registrar o que acontece com as folhas de "sua" muda - i.e., se algum folha nova surgiu e se alguma folha velha foi perdida. Nesse último caso, precisamos ser capazes de reconhecer e identificar cada folha individualmente, adotando para isso um sistema de marcação que não machuque ou prejudique o crescimento normal da planta. Um método indireto de marcação envolve a colocação de anéis plásticos, desses usados para fechar embalagens, sobre o pecíolo de algumas folhas (ver adiante).

Feito isso, podemos então começar o nosso estudo do comportamento de crescimento das plantas, adotando para isso os seguintes procedimentos:

1) Na primeira vistoria, devemos numerar as folhas de cada muda, começando da folha em posição mais apical (primeira folha) e terminando na folha mais basal (última folha). Colocar um anel plástico sobre o pecíolo de determinadas folhas - por exemplo, a cada três folhas (isto é, abaixo da terceira folha, da sexta, da nona etc.). Os anéis servem para criar posições para as folhas presentes, facilitando o reconhecimento individual. (Escrever ou fazer marcas nas folhas são métodos de marcação inapropriados e que, por isso mesmo, não deveriam ser utilizados.)

2) Nas vistorias subseqüentes, passamos então a registrar se alguma folha nova foi produzida e/ou se alguma folha velha foi perdida. Com o tempo, várias folhas serão produzidas e outras, perdidas; será necessário, portanto, fazer ajustes periódicos nos anéis, pois tanto a perda gradativa das folhas basais como o surgimento de folhas novas exigirão a recolocação ou a colocação de novos anéis. No primeiro caso, porque com a queda das últimas folhas os anéis de báixo vão perdendo apoio; no segundo caso, porque à medida que a planta acumule folhas serão necessários anéis adicionais.

Se o professor julgar apropriado, esse experimento pode acompanhar os alunos durante todo o ano letivo. A atividade também pode envolver o acompanhamento simultâneo de mais de uma espécie de planta ou de dois lotes de uma mesma epécie, um lote no sol e o outro, na sombra. Ao final da atividade, os alunos deveriam fazer um balanço geral do que ocorreu. O professor poderia orientá-los na elaboração de um relatório que descreva de modo resumido tudo aquilo que aconteceu com as mudas durante o estudo. Por exemplo, os alunos poderiam calcular a quantidade de folhas produzidas e perdidas, de acordo com o calendário, tentando com isso investigar se houve, por exemplo, um mês ou estação do ano que foi mais ou menos produtivo que os demais [4].

Contar o número de folhas presentes, é apenas uma das metodologias que podemos adotar no estudo do crescimento das plantas. Poderíamos também monitar o que ocorre com a área foliar, tomando duas medidas fundamentais de cada folha: o maior comprimento e a maior largura. Nesse caso, é bom lembrar que folhas individuais crescem até certo ponto e depois param, enrijecem e não se expandem mais. Ao invés disso, no caso de árvores muito altas, poderíamos acompanhar o seu crescimento monitorando o que ocorre com o diâmetro do tronco. Em casos assim, é costume medir o diâmetro do tronco a uma altura padrão do solo (cerca de 1,5 m); além disso, os intervalos entre medições sucessivas teriam de ser mais espaçados - digamos, uma vez por semestre.

Em todo caso, o professor não deveria esquecer de algo muito importante: guardar bem os registros das medidas obtidas ao longo do tempo, usando os dados de anos anteriores como um referencial e, ao mesmo tempo, como um exemplo de trabalho feito em equipe. Penso que os efeitos do estudo de séries temporais, produzidas por sucessivas turmas de alunos, podem ser extremamente positivos. Por um lado, porque com isso poderíamos efetivamente monitorar o comportamento de crescimento das plantas ao longo do tempo; por outro, porque agregaria um tremendo valor histórico ao sítio de estudo (quer seja o quintal da escola ou um terreno próximo) e isso tende a despertar a curiosidade e o interesse, recebendo em troca o respeito, a admiração e a atenção das crianças.


Notas

(*) Biólogo meiterer@hotmail.com, autor de Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas (2003).

1. A rigor, a Botânica só aparece com esse nome no Ensino Médio. Já ouvi comentários de alunos, classificando a Botânica como um assunto "chato e inútil" e sugerindo a sua retirada da grade curricular, a exemplo, aliás, do que muitos comentam sobre a Matemática. Ao contrário da Matemática, no entanto, que é uma disciplina "chata" porque é "difícil" (e é difícil pelo grau extremo de abstração que envolve), a Botânica parece ser classificada como uma disciplina particularmente chata porque seria "uma decoreba muito sem graça".
2. Encontrar graduandos em Ciências Biológicas que se revoltam contra o sacrifício de animais é algo relativamente comum; já conheci até mesmo quem decidisse abandonar a universidade por conta desses procedimentos, muitas vezes exagerados e descabidos.
3. Vasos para mudas em crescimento podem ser facilmente contruídos a partir do reaproveitamento de recipientes plásticos descartáveis, como garrafas vazias de refrigerante (2 litros). Outros tipos de recipiente podem ser aproveitados na confecção de vasos menores (potes de iogurte, óleo de cozinha etc.) ou maiores (potes de sorvete, conservas etc.). Para completar, precisamos ainda de uma tesoura, um prego grande, algumas pedras, cascalho e terra. Nesse ponto, o professor poderia aproveitar a oportunidade e, antes de prosseguir, chamar a atenção dos alunos para a questão da reutilização de objetos e materiais que habitualmente descartamos com facilidade.
Mas, vamos ao trabalho. Primeiro, o professor ou algum outro adulto deve cortar a garrafa, uns 15 cm abaixo do bico (garrafas de 2 litros têm cerca de 35 cm de altura); em seguida, fazer alguns furos no fundo com o prego. (Recolher e guardar as tampas que foram cortadas.) As atividades restantes podem ser feitas pelos próprios alunos, a saber: preencher o fundo da garrafa com uma camada de pedras, adicionar depois um pouco de cascalho e preencher o restante com terra, deixando um espaço de três a quatro dedos até a borda. Os furos no fundo da garrafa cumprem o papel de escoadouros do excesso de água; a camada de cascalho e as pedras visam facilitar o escoamento, evitando que a água fique retida por muito tempo e apodreça dentro do vaso.
Esses vasos podem ser utilizados em experimentos de germinação de sementes ou para receber mudas transplantadas. O pinhão, por exemplo, é uma semente bem didática: é grande e germina com facilidade e rapidez. Para acompanhar de perto a germinação do pinhão, podemos converter alguns dos vasos recém-confeccionados em mini-estufas, garantindo assim um ambiente ainda mais propício e estimulante. É simples: pegue um vaso; coloque o pinhão deitado, afundando-o levemente na terra; volte com a parte superior da garrafa, encaixando-a sobre o fundo, tampe-a. A nossa mini-estufa está pronta; em seguida, basta colocar a garrafa em um local que receba luz indireta, como debaixo de uma árvore. Em poucos dias, devemos testemunhar a germinação do pinhão e o surgimento de um novo pinheiro, cujo crescimento inicial é relativamente lento. A propósito, quando for transferir o novo pinheiro para o solo, escolha um local onde haja espaço suficiente para o seu pleno desenvolvimento, afinal trata-se de uma árvore de grande porte, que pode atingir até 50 metros de altura. Evite, portanto, transferi-la para locais próximos a edificações. Para mais detalhes, ver artigo "Você já plantou uma árvore?" (http://www.lainsignia.org/2002/septiembre/ecol_016.htm). 4. Em outras palavras, a produção e a perda de folhas variam ao longo do ano? Para um exemplo de estudo envolvendo esse tipo de questão, ver artigo "Demografia foliar: contando folhas no braço-de-preguiça" (http://www.lainsignia.org/2004/diciembre/ecol_004.htm).



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