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La insignia
25 de janeiro de 2004


Quem está perdido?


Felipe A. P. L. Costa (*)
La Insignia. Brasil, janeiro de 2003.


Em sua coluna "Rato de livraria", publicada na edição do dia 16/01/2004 do prestigioso sítio eletrônico brasileiro Nominimo, Flávio Pinheiro apresentou três comentários, sobre três livros recém-publicados. O segundo comentário -'Lenha na fogueira das vaidades'- terminava com o seguinte parágrafo:

"Popper conquistou sua reputação com o livro 'A Sociedade Aberta e Seus Inimigos', visto como profecia confirmada do fim do comunismo. Foi guru de conservadores e da democracia-cristã. Não tinha brilho especial mas, insuflado pelo pendor por polêmicas, crescia. Ficou datado, perdido no tempo. Wittgenstein sobreviveu a ele. O duelo entre os dois no fundo é um anti-duelo, em torno de uma causa menor que ambos."

Há mais de um problema nessa curta passagem ('fim do comunismo', 'guru', 'não tinha brilho especial'; além do que, não foi exatamente 'A sociedade aberta...' que deu fama e prestígio acadêmico a Popper), mas fiquei particularmente impressionado com a frase 'Ficou datado, perdido no tempo.' -usada, se entendi bem, para descrever a influência da pessoa e/ou do trabalho de Karl Raymond Popper (1902-1994)- [1].

Se foi mesmo essa a intenção, temo que o articulista tenha cometido um erro. E, para que o leitor dessas mal-traçadas dimensione o tamanho desse erro, sugiro uma pesquisa simples (e potencialmente falsificável): em sua próxima visita a uma livraria, procure por obras de epistemologia ou de filosofia da ciência publicadas ao longo dos últimos 50 anos -em particular, aquelas escritas nos últimos 10-20 anos-. Aposto então que não será difícil constatar que o conteúdo de tudo aquilo que hoje lemos ou falamos sobre filosofia e teoria do conhecimento ainda é em boa medida balizado pelos trabalhos de Popper [2] - mesmo que seja para discordar do seu enfoque ou de suas teorias (e.g., a noção de que hipóteses científicas, ao contrário de hipóteses não-científicas, podem ser falsificadas e refutadas) [3].

Por que então Karl Popper ou o seu trabalho estariam 'perdidos no tempo'? Não vejo como sustentar essa afirmação; na verdade, penso que o articulista teria feito melhor se encerrasse os seus comentários no penúltimo parágrafo. (Não é nada, não é nada, são deslizes aparentemente pequenos como esse que perpetuam e geram mal-entendidos crescentes em nossa imprensa; e, por tabela, em nossa literatura popular: como a generalizada e recorrente confusão que se faz entre ciência e tecnologia ou, mais grosseiramente, entre ciência, tecnologia e o mundo dos negócios.)


Notas

(*) Biólogo, autor do livro ECOLOGIA, EVOLUÇÃO & O VALOR DAS PEQUENAS COISAS (2003).

[1] Para uma entrevista com Popper, ver Horgan, J. 1998. O fim da ciência. SP, Companhia das Letras.
[2] Mesmo em português, a lista das obras (livros, artigos, transcrições de entrevistas ou palestras etc.) de Popper é expressiva, incluindo 'A lógica da pesquisa científica' (SP: Cultrix); 'Conhecimento objetivo' (BH: Itatiaia); 'Conjecturas e refutações' (Brasília: Editora da UnB); 'A pobreza do historicismo' (SP: Cultrix); 'O eu e seu cérebro', em co-autoria com John Eccles (Campinas: Papirus); 'Sociedade aberta, universo aberto' (Lisboa: Dom Quixote); os três volumes do 'Pós-escrito à lógica da descoberta científica' (Lisboa: Dom Quixote); 'Em busca de um mundo melhor' (Lisboa: Fragmentos); e 'Um mundo de propensões' (Lisboa: Fragmentos).
[3] Para uma abordagem crítica do 'falsificacionismo', ver Chalmers, A. F. 1993. O que é ciência, afinal? SP, Brasiliense; ver ainda Chalmers, A. F. 1994. A fabricação da ciência. SP, Editora da Unesp.



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