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23 de setembro de 2002 |
Saúde: Criar condições humanas
Linha Aberta. Brasil, setembro de 2002.
Apresentei na manhã da última sexta-feira, um documento chamado Saúde Para a Família Brasileira, sexto caderno temático do nosso programa de governo. O local do lançamento não foi escolhido por acaso: a quadra da escola de samba da Mangueira, região de baixa renda do Rio de Janeiro, estado que tem a maior rede pública de saúde, mas que simboliza hoje no nosso país o lugar onde houve o maior desleixo do governo federal no combate à dengue. Nada menos de 150 mil pessoas foram atingidas pela epidemia, com recorde de vítimas fatais, situação agravada no estado pela demissão de 6 mil profissionais pelo Ministério da Saúde.
Saúde, como se sabe, é um dos nomes da cidadania. Sem ela, é impossível assegurar a base de todos os direitos, que é o direito à vida. Tão importante quanto democratizar o acesso à saúde, é tomar medidas eficazes para corrigir a desumanização que tomou conta dos sistemas públicos de atendimento. Essa situação humilha o paciente, faz do médico um robô e reduz ainda mais a eficiência dos recursos sempre escassos nessa área. É preciso portanto enfatizar uma de nossas prioridades nesse setor: o aperfeiçoamento do Sistema Único de Saúde, o SUS, com ênfase na medicina preventiva, ou seja, na saúde da família. Essa é uma diretriz que atende a duas necessidades: faz crescer a eficiência do dinheiro gasto na saúde e reinjeta humanidade na relação médico-paciente - hoje no sistema de saúde o doente não passa de um número, uma ficha. Estudos internacionais mostram que é possível resolver 80% dos casos nas unidades básicas de atendimento. Ou seja, pode-se muito bem evitar o espetáculo absurdo de pronto-socorros que hoje misturam pessoas esfaqueadas com crianças e recém-nascidos apenas gripados. A ênfase na capilarização do atendimento preventivo não significa que outros aspectos do SUS não tenham que ser aperfeiçoados. O Brasil ainda gasta muito pouco com a saúde de sua população. Investimos menos que uma passagem de ônibus escolar (R$ 0,65) per capita/dia, para fazer do pré-natal ao transplante de coração. É muito pouco. E esse pouco ficou ainda mais irrisório na programação orçamentária prevista pelo governo FHC para 2003: para uma inflação projetada de 6%, os gastos com saúde vão crescer penas 1,8%. O Sistema Único foi uma conquista democrática dos anos 80, prevista na Constituição Cidadã, que reconheceu a saúde como direito republicano, portanto universal, e um dever do Estado. Graças a isso, o Brasil construiu um dos mais amplos e universais sistemas de saúde do mundo, fruto de anos de lutas de profissionais da área, lideranças políticas e entidades civis. O SUS unifica o sistema num comando único em cada esfera administrativa (municipal, estadual e federal). Elimina a dispersão e a sobreposição de estruturas tão comuns em outras áreas de governo. Define critérios claros de repasses e evita o clientelismo. É por isso que a filosofia do SUS deve servir de inspiração para reformular outras áreas do Estado brasileiro. Capacitar Estados e municípios para planejar, desde a base, o sistema de saúde brasileiro e articular melhor os seus diversos níveis, das unidades básicas aos hospitais especializados, são algumas das muitas medidas complementares previstas. Uma rede de pronto-socorro para cada 100 mil brasileiros e um hospital de urgência para cada grupo de 500 mil são, por exemplo, parâmetros indicativos. Mas, sem dúvida, o mais urgente desafio a ser atacado é o precário atendimento dispensado hoje a milhões de pessoas que acorrem à rede pública. Fila é a palavra síntese que espelha o funil ainda estreito do acesso à saúde no Brasil. A fila é o sintoma de uma falha estrutural na filtragem do sistema. Ela é o efeito. A causa é a ausência de uma sólida estrutura de atendimento no núcleo básico da sociedade, a família. O programa Saúde da Família existe no Brasil desde 1994. Foi criado no governo do presidente Itamar Franco. Experiências pioneiras mostraram sua eficácia em várias partes do país. Prefeituras administradas pelo PT, como Icapuí e Quixadá (CE) e Catanduva (SP), por exemplo, ou compartilhadas com outros partidos - caso de Sobral (CE), uma administração do PPS, cujo secretário de saúde era o médico petista Odorico Tavares - maximizaram a eficiência do atendimento com prioridade à família. Um caso emblemático é o de Camaragibe (PE), em que o prefeito Paulo Santa, do nosso partido, pôde até eliminar uma ala de pediatria no hospital municipal: o atendimento na base ficou tão bom que reduziu drasticamente a demanda na unidade central. |
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