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La insignia
22 de setembro de 2002


Brasil

Por que voto no Lula


__Especial__
Brasil: Eleições 2002
Frei Betto
Adital. Brasil, setembro de 2002.



Meu voto é Lula. Embora seja cristão e acredite em milagre, não creio que Deus fará pelo Brasil o que os brasileiros se recusam a fazer. Portanto, não fará o maná cair do céu para matar a fome de 53 milhões de pessoas; não enviará um raio para erradicar a dívida e(x)terna; não transformará o Banco Central numa cornucópia para saciar de fortuna os projetos sociais. Por isso, não voto em Garotinho.

Como estou decepcionado com os oito anos de governo FHC, nos quais o Brasil menos cresceu em toda a história da República, e agora se afunda numa dívida pública em torno de R$ 750 bilhões, também não quero ver pela frente as mesmas caras: o Malan monitorando a economia em nome do FMI; o Pedro Parente fazendo de conta que entende de energia elétrica; o ministério da Justiça cruzando os braços frente ao crime organizado em terra capixaba. Por isso não voto em Serra.

E como não tenho memória curta e guardo a amarga lembrança do breve período Collor, minha insanidade não é suficiente para que eu cometa a loucura de votar em Ciro Gomes. Deixo a ele os votos de Collor e de ACM. Não o meu, que muito prezo. Jamais confiei em salvadores da pátria que, como Jânio Quadros, mais confundem que aclaram, mudando de opinião segundo a conveniência política do momento.

Nomeado ministro da Fazenda por Itamar Franco, após a desastrada entrevista do ministro Ricúpero, Ciro Gomes ficou quatro meses no governo FHC e criou problemas suficientes para não ser chamado de volta ao cargo no segundo mandato do presidente. Seu desequilíbrio emocional frente às perguntas dos jornalistas não me permite supor que, uma vez eleito, ficará curado do destempero e da agressividade. E estou cansado de ver o PFL usufruir o poder sem deixar cair do banquete dos abastados ao menos uma migalha para os pobres. E o PFL está com Ciro.

Voto Lula porque ele tem lastro político, um partido consistente, um programa viável, uma equipe invejável. Prefiro estar ao lado de Maria Victória Benevides, Dalmo Dallari, Fábio Konder Comparato, Marilena Chauí, Luiz Pinguelli Rosa, Emir Sader, Paulo Nogueira Batista Júnior, Marina da Silva, Eduardo Suplicy, Cristovam Buarque, Antonio Candido etc. etc., e também da CUT, da CMP e do MST, que estão com Lula, do que ficar mal acompanhado.

Lula não será a salvação da pátria, mas tem todas as condições para arrancar o Brasil da condição de Belíndia (este misto de Bélgica com Índia) ou de Colombina (a violência da Colômbia com a quebradeira da Argentina). Enfim, reduzir consideravelmente a desigualdade social. Segundo o Banco Mundial, insuspeito, 20% dos brasileiros mais ricos embolsam 64,1% da renda nacional, enquanto os 20% mais pobres ficam com a migalha de 2,2%.

Entre 60 países do mundo, o Brasil é o terceiro em assassinatos, atrás da Colômbia e de Porto Rico. Em 2000, morreram assassinados 45.919 brasileiros. Entre os jovens de 15 a 24 anos, o índice cresceu 48% na última década. Dos 76,1 milhões de trabalhadores, 64 milhões têm ocupação e os demais estão desempregados. Dos que trabalham, 24,4% ganham no máximo 1 salário mínimo por mês; 27,5%, até 2 salários mínimos; 13,6%, até 3; 14,2%, até 5; 12,5%, até 10; 5,1%, até 20; e apenas 2,6% ganham acima de 20 salários mínimos (ou mais de R$ 4 mil) por mês.

Ou seja, 51,9% dos trabalhadores ganham no máximo R$ 400 por mês. E há 1.049.939 crianças de 10 a 14 anos no mercado de trabalho, das quais 39% trabalham entre 15 e 19 horas semanais, sendo que 9% cumprem jornada semanal de 49 horas ou mais. Os dados não são da CUT nem do MST. São oficiais, do IBGE.

Como trabalhador metalúrgico e sindicalista, Lula priorizará os investimentos produtivos, combaterá a especulação financeira, promoverá a reforma tributária e, com ela, os mecanismos de distribuição de renda. Se ele não assegurar a cada brasileiro ao menos 1 prato de comida por dia, ficará desmoralizado. É impensável um governo Lula sem reforma agrária, tributação do capital especulativo e uma política eficaz de combate à fome.

Lula vai inverter a pirâmide da educação que, no Brasil, anda de cabeça pra baixo. Basta dizer que 1/3 da população com mais de 10 anos de idade é analfabeta funcional, pois não completou quatro anos de estudos. Dos recursos do MEC destinados ao ensino médio, só 8% vão para alunos oriundos da esfera dos 20% mais pobres da população. E dos recursos que chegam às universidades públicas quase a metade é gasta com alunos que pertencem à casta dos 20% mais ricos da população. O governo Lula vai injetar mais recursos na educação, estratégia prioritária para arrancar o Brasil do atraso.

Lula vai. Vai o quê? Sozinho ele não vai nada. A menos que elejamos, com ele, um Congresso Nacional progressista. Ainda assim, isso não será o suficiente. Se eleito, Lula só terá condições de governabilidade de houver mobilização permanente da sociedade civil. Será o primeiro a governar, não contra o povo, nem para o povo, mas com o povo, transformando em real a nossa democracia formal. É esta a aliança que tornará viável o governo Lula: com o povo brasileiro. Fora disso, nem ele nem o PT tem salvação.

Mas para que o sonho se torne realidade é preciso, agora, todo empenho na eleição de Lula e de governadores, senadores, deputados federais e estaduais, que haverão de garantir condições para o Brasil mudar. Para melhor.



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