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La insignia
13 de setembro de 2002


Brasil

«Também morre quem atira»


Laerte Braga
La Insignia. Brasil, setembro de 2002.



Fernandinho Beira Mar, apontado como o principal traficante de armas e drogas do Brasil adotou o estilo José Serra e partiu para cima de seus adversários liquidando a bala os principais. Serra usa um tipo de bala diferente: a mentira, a calúnia e toda a capacidade tucana para transformar o Brasil num imensa fazenda do capital estrangeiro, mero posto de troca de cavalos das diligências da Wells Fargo.

Beira Mar mostrou um poder impressionante, só possível com a cumplicidade das autoridades policiais e carcerárias. Um especialista no assunto, tráfico de drogas, afirmou que "há uma disputa de mercado entre as quadrilhas". Manteve o País um dia inteiro horrorizado com a violência.

Os principais noticiários da televisão brasileira conquanto tratassem do assunto, até em edições extraordinárias, não deixaram de lado a preocupação com a economia. No Brasil de FHC o que conta é o dólar, se sobe ou cai e a bolsa de valores. Violência é um sintoma da doença social mais grave de nossa história e está banalizada pelas imagens diárias de assaltos, guerras de quadrilhas, nada diferente do que acontece em Brasília, no Planalto, ou na campanha do candidato tucano. José Serra. Apenas as armas. Os efeitos e os propósitos são os mesmos, de Beira Mar e de Serra e o que ele representa: mercado. Livre mercado. Controle absoluto de tudo e todos pelo mercado.

Uma das principais organizações criminosas do Brasil, o PCC, com sede em São Paulo e responsável por um dos maiores motins penitenciários já registrados por aqui, tem grife, produz roupas e adereços e já tentou virar partido político.

O Comando Vermelho, organização a quem pertence Beira Mar é a mais antiga e surgiu da mistura de presos políticos e criminosos comuns, no extinto presídio da Ilha Grande, no Rio. Os presos comuns aproveitaram a experiência dos presos políticos em organização, táticas, estratégia, etc e criaram o comando.

O que Beira Mar fez, na quarta e quinta feiras desta semana e estarreceu o País. Foi o que Serra fez em dez dias com Ciro Gomes e prepara-se para fazer com Lula, caso confirme sua passagem ao segundo turno das eleições presidenciais.

O traficante de armas e drogas dominou guardas de um presídio de segurança máxima, Bangu I e, armado de pistola, junto com seus subordinados, passou para a ala dos rivais, onde executou os chefes adversários. Beira Mar controla o crime organizado a parte que lhe toca, a partir de telefones celulares e lap top conectados â rede mundial de computadores, diretamente do presídio.

Para se ter uma idéia do poder do traficante a polícia do Estado do Rio temeu, enquanto durou a rebelião comandada por ele, que a guerra se espalhasse pelos morros da cidade, uma das maiores do Brasil, o Rio de Janeiro, criando um clima de guerra civil.

Um estudo das Nações Unidas divulgado há pouco mais de dois dias e publicado em todos os principais jornais brasileiros mostra que o Estado do Espírito Santo, governado por um ex ministro de FHC e controlado pelo crime organizado, tem situação semelhante à da Colômbia, no que tange ao tráfico de drogas.

Há cerca de um mês o Procurador Geral da República, Geraldo Brindeiro, também conhecido como "engavetador geral", pediu a intervenção federal naquele Estado. O governador, José Inácio, era apontado como corrupto. As provas existem aos montes. Brindeiro foi chamado a Palácio por FHC e no dia seguinte desistiu do pedido. Inácio não apoia Serra explicitamente para não complicar, está desgastado, mas colocou a máquina estadual para trabalhar pelo candidato governista.

Há quadrilhas em Brasília e quadrilhas nos morros das maiores cidades brasileiras. Os métodos são os mesmos, variando apenas o estilo de sofisticação dos bandidos. O governo já anunciou três grandes planos para combater a violência todos pararam depois de fartos discursos e propagandas. Os recursos destinados aos tais planos foram para os bancos, pagamento dos juros, serviços e principal da dívida externa. O assunto só volta à tona quando morre alguém da elite, ou quando acontecem fatos como os desta semana.

Morrem mais pessoas no Brasil, vítimas de assassinatos por ano, que na ação exterminadora de Israel contra os Palestinos.

O 11 de setembro no Brasil, um ano depois de derrubadas as torres gêmeas do World Trade Center, foi no presídio de segurança máxima Bangu I. E um detalhe: respinga no governo petista de Benedita da Silva. Culpada? Disso não. Pegou nas mãos a bomba de efeito retardado deixada pelo ex governador Anthony Garotinho, um dos políticos mais corruptos do Brasil.

Não existe combate à violência no Brasil. Não existem políticas preventivas e tampouco preocupação com as polícias civil e militar na imensa maioria dos estados brasileiros dominada pelo corporativismo e corrupção. Na Polícia Federal um preso que assassinou um agente foi morto debaixo de tortura. As fronteiras entre o crime a autoridade policial foram perpassadas de muito por um e outro. São poucos os que podem apresentar trabalho sério.

Que diferença existe, por exemplo, entre a ação da Polícia Federal, Polícia Tucana, contra Roseana Sarney (para beneficiar José Serra) e o que fez Beira Mar? Só estilo, característica e eliminação física dos adversários. Agílio Ribeiro, então diretor da Polícia Federal é candidato a deputado federal pelo partido de Serra.

Que diferença existe entre o ataque a Ciro Gomes, com a cumplicidade da Justiça Eleitoral e a ação de Beira Mar? Ou com a ação da Polícia do Pará contra os sem terra no massacre de Eldorado do Carajás? Ou no fazendeiro que atira com lavradores? Não há nenhuma.

O Brasil hoje é um País permeado pelo crime, em todas as instâncias. Beira Mar é conseqüência da impunidade que mantém no governo alguém como FHC e permite que Serra seja candidato a alguma coisa.

O horror que FHC declara ter sentido ao ver as cenas da rebelião comandada pelo traficante é o mesmo que os brasileiros manifestam diante dos brutais índices de desemprego. Da saúde privatizada. Da educação pública sucateada e transformada em mercado para os barões do ensino. Do País transformado em colônia, privatizado em tudo e por tudo.

A diferença é que a "Globo" é contra Beira Mar e a favor de FHC. Operam campos distintos e certamente não haveria necessidade de repressão se não houvesse a arrogância de Beira Mar em mostrar-se como alguém poderoso. Pura hipocrisia.

Há cerca de dois meses morreu o jornalista Tim Lopes assassinado por ordem de um cúmplice de Beira Mar. As únicas imagens usadas pela "Globo" para deplorar o acontecimento foram cenas que sugeriam sexo explícito num baile funk. Uma outra jornalista da rede pediu demissão e foi para o exterior, medo de ser assassinada, faltavam-lhe garantias mínimas para ficar aqui. Foi jogada à própria sorte.

Beira Mar, FHC, Serra, ACM, Malan, Armínio, Aécio, são apenas nomes num processo que esmaga uma nação inteira e soterra as aspirações de um povo. Só isso. Essa gente vive cercada de seguranças e protegida em condomínios de alto luxo.

Não há diferença entre eles e nem no que fazem.

Mas, enfim, como diz uma canção americana da década de 50 e que fez um estrondoso sucesso no Brasil recentemente: "...também morre quem atira..."

Por enquanto só tem morrido gente de bala perdida. De desemprego. De fome. De desespero.

A doença atingiu de tal forma os brasileiros que um cidadão num caixa de super-mercado, hoje, ao comentar o assunto, disse que torceu o dia inteiro para que Beira Mar fosse vitorioso contra seus adversários. Acha que ele é mais "confiável".

A barbárie e a selvageria estão sendo incorporadas pelo cidadão comum.



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