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La insignia
23 de julho de 2002


Brasil

Poloneses no RS: Uma história por contar


Mário Maestri (*)
La insignia. Portugal, julho de 2002.


Os primeiros camponeses de língua alemã que chegaram ao Sul, a partir de 1824, fixaram-se nas proximidades da capital, onde receberam gratuitamente setenta hectares de terra e outras ajudas materiais. Meio século mais tarde, em 1875, imigrantes vindos do norte da Itália compraram colônias financiadas de uns vinte e cinco hectares, de terras mais pobres, em cotas superiores da Serra, mais distantes dos mercados consumidores.

A imigração polonesa foi o terceiro impulso migratório sulino, temporal e quantitativamente. Ele acelerou-se nos momentos anteriores à Primeira Guerra, encerrando-se quando a Europa foi outra vez engolida pelo confronto mundial. No Sermão da Montanha do movimento migratório sulino, os últimos comeram o pão que o diabo amassou.

Os poloneses que procuravam no sul do Brasil o sonho negado na Europa, a posse de nesga de terra para enraizar suas existências, compraram uns vinte hectares de terras pobres, distantes dos grandes mercados.

As dificuldades da conformação nacional da Polônia e suas vicissitudes no século 20 ensejaram que os imigrantes poloneses jamais tenham contado plenamente com o importante apoio diplomático nacional, como os vizinhos alemães e italianos. Os handicaps negativos do estabelecimento, consolidação e desenvolvimento desse movimento migratório ensejaram explicações triviais, preconceituosas e, não raro, de cunho racista, sobretudo no seio das outras comunidades imigrantes.

A historiografia da imigração polonesa também é a prima pobre de família cada vez mais rica. As vicissitudes nacionais polonesas; a tardio chegada ao Sul; a pobreza das terras; a falta de uma capital polonesa sulina, etc. atrasaram a gênese de estudos historiográficos científicos sobre ela.

Essa comunidade desconhece a profusão de estudos de que dispõe a imigração teuto-italiana. E boa parte da literatura de que possui é produto do valioso esforço de historiadores leigos, influenciados pelas mesmas determinações ideológico-culturais que embalaram a historiografia étnica teuto-italiana.

A língua tem sido um outro entrave no estudo dessa colonização. Ele exige o conhecimento da história e da historiografia polonesa sobre a emigração; da documentação oral e escrita colonial - correspondência familiar; livros tombos; depoimentos orais, etc. Em maior parte, essa documentação está em polonês.

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São várias as razões para festejar o lançamento de Montanhas que furam as nuvens! A colonização polonesa em Áurea - RS. 1910-1945 [Passo Fundo: UPF Editora, 2002. 173 pp.]. Sua jovem autora nasceu no seio de família de descendentes de imigrantes poloneses, sendo introduzida ainda criança no idioma e hábitos dos avós.

Portanto, Thaís Janaína Wenczenovicz possuía intimidade natural com a comunidade e com a região que escolheu para tema de dissertação de mestrado, aprovada com excelência, em abril de 2002, no Programa de Pós-Graduação em História da UPF.

Destaca-se também em seu trabalho o espaço geográfico delimitado. No RS, o município de Áurea, onde nasceu a autora, é o mais homogeneamente polonês e, portanto, muito representativo desse movimento migratório.

Merece também destaque o esforço da autora em superar as narrativas apologéticas da historiografia étnica, sem desconhecer suas contribuições, sobretudo empíricas. A profunda empatia de Thaís Janaína com a região e a comunidade que estuda não embaralha seu olhar, permitindo-lhe realizar leitura talentosa e inovadora.

Não são heróis de papel, mas seres de carne e osso, os imigrantes que apresenta na longa viagem da Polônia até o norte do Rio Grande, na chegada e no estabelecimento nos lotes de terras dobradas onde plantaram um destino, para si e para os seus.

A documentação levantada, apresentada e discutida contribui para a elucidação de alguns dos enigmas desse movimento colonial. Ela comprova a escassa qualidade da terra, o afastamento dos mercados e, portanto, a dificuldade de acumulação da comunidade colonial de Áurea.

Thaís Janaína vai mais longe. Perscruta recantos escondidos das comunidades coloniais, em geral obscurecidos por falsos pudores. O nascimento, a morte, o suicídio, as doenças físicas e mentais, etc. são lidos como expressões determinadas da luta comunitária pela produção e reprodução das condições materiais e espirituais de existência.

Montanhas que furam as nuvens! A colonização polonesa em Áurea - RS. 1910-1945 apresenta-nos uma jovem historiadora que, profundamente ligada à comunidade em que nasceu, compreende-a como parte de realidade regional, nacional e internacional mais ampla e complexa.


(*) Mário Maestri é professor do Programa de Pós-Graduação em História da UPF.



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