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La insignia
21 de janeiro de 2002


Usos e abusos do correio eletrônico


Antonio Ozaí da Silva*
Espaço Acadêmico. Brasil, janeiro de 2002.


Há homens que escrevem por escrever, como há os que falam por falar. Nenhuma idéia, nenhum propósito, nem nos discursos de uns, nem nos livros dos outros; nós os lemos e não compreendemos nada, ou não ficamos sabendo de nada com eles. Esses autores não entendem a si mesmos. Por que escrevem, então?
-Abade Dinouart-


Vivemos numa época em que muito se fala e pouco se entende; em que muito se escreve e pouco se comunica. É um tempo onde o excesso de informação satura os espíritos mais pacientes; uma época onde a dificuldade maior é separar o joio do trigo e conseguir aproveitar minimamente os gigabytes de dados que enchem nossas caixas postais e outras coisas mais que a boa educação não permite nomear.

Quem não se comunica se trumbica, já dizia o velho Chacrinha. Em nossos dias ampliou-se de forma gigantesca os meios de comunicação. Proporcionalmente, aumentou a possibilidade de se trumbicar. Comunicar, nos ensina o Aurélio, tem origem no latim communicare, que significa, entre outros termos, fazer saber; tornar comum; participar; estabelecer relação. Ora, só posso tornar comum o que diz respeito ao outro e é legível e inteligível.

É interessante que comunicar também tenha o sentido de dar, conceder, doar. O ato comunicativo tanto pode ser impositivo quanto partilha. Compartilhar é usar em comum, é participar de, tomar parte em. Uma informação compartilhada é aquela que estabelece uma relação comum entre o transmissor e o receptor; significa que tem significado para ambos; é uma mensagem que acrescenta e tem um sentido positivo.

Boa parcela do que recebemos via email não é partilha, mas imposição. É simples: o remetente parte do pressuposto de que sua mensagem é de fundamental importância e não se pergunta se é do interesse do destinatário. São vários os tipos de internautas que sofrem deste mal:

1. Há os que são militantes internautas profissionais cuja função é simplesmente nos encher de mensagens, congestionar o tráfego eletrônico e contribuir com o enriquecimento das empresas de telefonia. Como messiânicos idealistas imaginam transformar o mundo na proporção das mensagens enviadas.
2. Há os que se arrogam o direito de determinar que sejamos suas correias de transmissão: crentes de que expressam a redenção humanidade, porque se filiam a este ou aquele movimento, elegem-nos como divulgadores em potenciais das suas mensagens. Esquecem de pedir por favor; parece-lhes que temos obrigação de passar adiante o que nos enviam. Não questiono a mensagem em si, mas o procedimento autoritário.
3. Há os que pecam por ingenuidade, por desconhecerem os mecanismos para o bom uso do programa do correio eletrônico ou por simplesmente não pararem para pensar sobre os seus próprios atos.

Para os primeiros casos não há solução possível senão o bom senso para evitar os excessos. Se você é uma pessoa que se identifica com ideais à esquerda, precisará de mais paciência e sensatez, pois não será tão fácil bloquear remetentes que são seus companheiros, ainda que você os conheça só por e-mail. Mas, cuidado: se você é de esquerda mas protesta contra o excesso de mensagens, de anexos etc., poderá ser ganhar algum rótulo nada agradável.

Seja ainda mais paciente com o terceiro tipo. É como disse aquele filósofo que morreu na cruz: eles não sabem o que fazem! Mas, não saia por aí ensinando lições que não são solicitadas. Podem achar que você é muito pretensioso. Use simplesmente o bom e velho procedimento de deletar e mantenha as amizades.

Mas se você tem uma maior intimidade com o seu interlocutor e tem certeza de que ele não ficará magoado faça algumas sugestões. Primeiro, peça-lhe que controle a compulsão de usar o recurso forward (encaminhar). Explique-lhe que a possibilidade de outras pessoas terem a mesma idéia é muito grande. O circuito das pessoas com áreas de interesses comuns que se comunicam via internet é enorme e isto gera uma situação nada agradável: receber várias vezes a mesma mensagem e de endereços diferentes.

Vejamos alguns exemplos: o atentado de 11 de setembro, a guerra no Afeganistão e a situação da Argentina, entre outros casos, geraram uma montanha de mensagens repetidas. Fulano é de esquerda e manda para todos do seu catálogo de endereços; sicrano recebe e, sem se dar ao trabalho de pensar ou observar se os nomes para quem foi endereçada a mensagem não constam do seu endereçário, tem o mesmo procedimento. Resultado: uma avalanche de mensagens... Agora, imagine se estas mensagens contém anexos – alguns deles com centenas de bytes, como os famosos slides, imagens em geral etc. Sugira ao seu amigo que, antes de enviar coisas que circulam com certa freqüência pela internet, tenha o singelo gesto de perguntar se você já recebeu aquele belíssimo e altamente contestador conjunto de slides sobre este ou aquele tema.

Aproveite e peça ao seu amigo que pare enviar mensagens com aquelas montanhas de setinhas (>). A informação tem conteúdo, mas também tem forma. O texto deve ser limpo e acessível. Às vezes procedimentos que dificultam a leitura impedem o acesso a um excelente conteúdo. Como evitar isso? Se seu amigo é dos que enviam mensagens tipo forward (encaminhar), informe-o que é possível configurar o programa de email para evitar as tais setinhas. Siga os seguintes passos:

1. Com o programa de correio eletrônico aberto (Outlook Express) clique em ferramentas e em opções;
2. Ao clicar opções uma janela será aberta: clique em envio e depois, no item “Formato para envio de Mensagens”, clique em Config. de texto sem formatação;
3. Ao abrir a janela correspondente, observe o quadrinho onde está escrito à frente “recuar o texto original com” e deixe-o em branco – se ele estiver assinalado, clique em cima que ele desativará o recurso da >. (No Netscape o procedimento é um pouco diferente, mas também é possível sumir com a setinha)

Geralmente, o amigo desavisado que envia várias flechinhas, como se desejasse atingir seu coração – existe um cupido para a amizade? – também tem o costume de enviar as mensagens com uma lista gigante de endereços no corpo da mensagem. Sabe aquelas mensagens que para iniciar a leitura você tem que ficar um tempão descendo a barra de rolagem? Pois é: também tem remédio para isso. Peça ao seu prestativo amigo para enviar as mensagens coletivas com Cópia Oculta, assim, além de nos livrarmos daquelas listas chatas, não damos publicidade aos e-mails dos demais amigos e evitamos que os mesmo recebam mensagens indesejáveis enviadas por alguém que copiou o e-mail da relação contida na mensagem. Observe ao amigo que nem todos gostam de divulgar seus endereços eletrônicos.

A esta altura, seu amigo já estará te achando um chato e sua amizade pode estar correndo risco. Redobre a paciência: explique-lhe que é para o bem de todos, inclusive o dele. Por outro lado, seu amigo deve estar apavorado com tantas questões técnicas. Ora, diga-lhe que um analfabeto deixa de sê-lo quando aprender a ler, escrever e a compreender o que faz e porque o faz. Pergunte a seu amigo se ele deseja permanecer como um analfabeto informático. E se ele aceitou sua observação, ensine-o a enviar as tais cópias ocultas. É fácil:

1. Peça para ele criar grupos – quantos desejar – em seu catálogo de endereços (com este aberto, clique em arquivo e em ‘novo grupo’; pronto: é só seguir os passos que o próprio programa indica).
2. Ao compor a mensagem ele deve abrir a janela selecionar destinatários – clicando em para – e, após selecionar os destinatários clicar em CCO (ou BCC). Basta dá um ok e enviar a mensagem.

Aproveite que tocou no assunto e peça-lhe que faça o obséquio de não inscrever o seu e-mail nas inúmeras listas de discussões que povoam a internet. É mais sensato que ele indique a lista e sugira que você mesmo se inscreva. Ocorre que, mesmo que o tema seja do seu interesse, nem sempre você está em condições de receber e ler as dezenas de mensagens que chegam diariamente. É melhor que a decisão seja sua.

Agora, se seu amigo é daqueles quem tem ojeriza à internet e que considera o e-mail um meio frio e despersonalizado de comunicar-se, daqueles que só utiliza este meio para o mínimo necessário, então você terá mais trabalho de convencê-lo a aperfeiçoar os procedimentos para um bom uso deste instrumento. Aí, talvez seja melhor desistir e conservar a amizade.

Contudo, pense bem: ele não está completamente errado. De fato, o e-mail tem essa característica insípida que tende a transformar a comunicação entre as pessoas em mero formalismo. Os exemplos são vários: pense na enorme quantidade de mensagens que você recebe e que não diz respeito diretamente à sua pessoa. Quantas das mensagens que você recebe diariamente são do tipo das que exigem e merecem respostas? A maior parte é apenas informativa e o excesso de informação nivela por baixo o essencial e o supérfluo. Confesse: você não se dá ao trabalho de ao menos rolar a barra de mensagens e já deleta tão logo execute um passar de olhos pelo assunto e o remetente. Aliás, alguns já são tão manjados que você age mecanicamente – talvez aquela mensagem tenha algo de importante e você já deletou...

A época das festas de finais de ano ilustra bem a natureza gélida e impessoal do e-mail e parece dar razão às críticas do seu amigo. Quantos cartões e mensagens de natal e de feliz ano novo você recebeu? Quantos expressavam um real conteúdo pessoal e fugia ao vulgar formalismo de não passar em branco? Quantos eram realmente de pessoas de você goza de alguma intimidade? Quantos não se encaixam no mais puro modismo e clima hipócrita que impera em tais fases? Você acha que uma mensagem coletiva de Feliz Ano Novo pode ser pessoal e lhe tocar diretamente? E aqueles que enviam os mesmos cartões e dizeres do ano anterior? E os propagandísticos e mercadológicos? Longe de nós duvidarmos da sinceridade das pessoas e, mesmo, da necessidade que certas pessoas têm em desejar o bem não importa como nem a quem. Mas, convenhamos, seu amigo tem razão.

Como fazer para que a impessoalidade e a gelidez deste meio de comunicação não se sobreponha sobre as coisas boas que ele proporciona? Como evitar que seu amigo seja apenas mais um na imensidão de mensagens que abundam na tela do monitor do seu computador? Como diferenciar o que é pessoal do geral? Basta organizar a sua caixa de correspondência. Faça assim:

1. No Outlook, clique em Ferramentas e em Regras para mensagem email;
2. Ao abrir a janela clique Nova;
3. Na nova janela, selecione as condições e ações para as regras; dê um ok e pronto! Será como se seu amigo tivesse uma caixa postal especialmente para ele.

Aliás, é falsa a idéia de que o e-mail favorece apenas a impessoalidade. Quantas pessoas que travamos uma relação de maior proximidade não conhecemos por e-mail? Quantos bons interlocutores não descobrimos por acaso? Quantas oportunidades surgiram pelo simples uso do e-mail? O e-mail também aproxima as pessoas, facilita a comunicação e abre novas possibilidades de relacionamentos. Se soubermos usá-lo, ele será mais eficiente.

Com tudo isso, você ainda poderá receber e-mails indesejáveis. O que fazer com eles? A boa ética ensina que devemos enviar um e-mail ao remetente pedindo para ele suspender o envio. Mas nem sempre isso dá certo. Quantas vezes, nos casos das listas, não enviamos as famosas mensagens cancelar subscrição (unsubscribe) e teimosamente o destinatário continua a nos enviar seus fatídicos e-mails. E então é um Deus nos acuda para conseguir fazer cumprir a nossa vontade – e o nosso direito – de não mais receber tais mensagens.

Há os casos em que se trata de um impertinente amigo ou colega – este, na maioria das vezes, conhecido apenas por e-mail – que insiste em lhe brindar com aquelas mensagens inconvenientes. Nestes casos, embora na maioria das vezes, para safar-se aos procedimentos legais que garantem sua privacidade, o próprio remetente indique que você pode cancelar o recebimento, fica difícil fazê-lo: sempre há o receio de que o mesmo se magoe com a sua iniciativa. Aqui, talvez o melhor seja não pedir o cancelamento do envio de mensagens e continuar a usar o velho hábito: deletar. Mas você pode, se considerar mais apropriado, criar uma regra para bloquear. Como agir? Com o programa de correio aberto clique em mensagem e você terá a opção de bloquear os remetentes indesejáveis.

A propósito, o e-mail é um meio de comunicação que pressupõe agilidade e instantaneidade. Não é nada educado demorar-se em demasia para responder uma mensagem pessoa – ou, o pior, deixá-la sem resposta. Evite também aquelas respostas automáticas e burocráticas. Se você não deseja se corresponder com a pessoa é melhor ser transparente e enviar uma mensagem solicitando o cancelamento de novas mensagens ou aplicar as regras para mensagens acima. Mas, se você optar por continuar recebendo as mensagens, faça o favor de respondê-las.


(*) Docente na Universidade Estadual de Maringá e autor de História das Tendências no Brasil.



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