Portada Directorio Buscador Álbum Redacción Correo
La insignia
24 de janeiro de 2002


Fórum Social Mundial

Rede Praxis: Informação no mundo globalizado


Laerte Braga


A Rede Praxis, grupo de internautas e militantes de esquerda com atuação em todo o Brasil vai realizar uma oficina no FSM - Fórum Social Mundial -, em Porto Alegre, Brasil, para discutir o tema "A Informação no Mundo Globalizado".

A oficina pretende servir de base para um amplo estudo sobre a mídia globalizada e sua transformação em instrumento de dominação das classes trabalhadoras.

Demerson Dias, um dos coordenadores da FENAJUFE - Federação Nacional dos Servidores no Judiciário Federal - e o sociólogo Sidartha Sória e Silva são os coordenadores da oficina. Laerte Braga e Fernando Santana (jornalistas); Ricardo Camargo Versiani, procurador do Ministério Público do Rio Grande do Sul e um representante da agência de notícias VERAZ, encarregada da divulgação do FSM serão os opositores.

A oficina acontecerá no dia 3 de fevereiro, das 13h às 19 horas, na sede da ADUFRGS - Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

O documento básico da oficina que servirá para nortear os debates é o seguinte:


A INFORMAÇÃO NO MUNDO "GLOBALIZADO"

I - INTRODUÇÃO

A proposta de uma Oficina para o Fórum Social Mundial, em que "informação" seja tratada como instrumento decisivo para a construção de alternativas ao modelo de "globalização" segundo a ótica das potências e grupos dominantes, é buscar trazer para o debate a frase pronunciada pelo professor Plínio de Arruda Sampaio (o pai) e que sintetiza todo o poder da palavra no mundo contemporâneo:

"A revolução, hoje, não se faz com metralhadoras, mas com a palavra". A guerra, em curso, contra o Afeganistão é a uma prova evidente dessa sentença. A batalha da informação é maior, ou pelo menos igual, àquela travada pelas bombas, pelas armas. A preocupação do governo norte-americano em controlar as notícias, em filtrar os fatos conforme seus interesses, contagiou todo a mídia ocidental.

Um jornalista da "Globo News, canal noticioso do sistema de tevê a cabo da Rede Globo, dava as notícias, na edição das 18 horas do dia 15 de outubro, com uma gravata com as cores da bandeira norte-americana. A informação deixou de ser o instrumento de trabalho do jornalista. Os press releases passaram a dominar as redações sejam elas de jornais, revistas, noticiários de rádios ou redes de televisão.

A tecnologia de comunicação via satélite é o ítem mais abrangente de um grande complô contra a cidadania, tanto dos indivíduos, como dos povos. O objetivo é a homogeneização para mais facilmente dominar. Jornais e revistas limitam-se aos temas que lhe são permitidos noticiar e comentar. Rádios e tevês seguem os mesmos caminhos, numa estranha sintonia, que acaba convencendo o cidadão de que não há outros pontos de vista a comentar ou a se opor ( uma forma de lavagem cerebral).

E durante o lazer, inclusive, nos cinemas, o padrão do pensamento único infiltra-se nos roteiros exibindo o mundo pasteurizado de sonhos homogêneos. Ou nas artes em geral. Estamos sofrendo um longo período de inanição criativa. Nas ciências, onde nada se inventa a muitos anos, preocupação já denunciada por cientistas.

São as conseqüências do impacto desse processo constante de pasteurização dos sonhos individuais, da unificação da informação coletiva e constante dissuasão do exercício da discordância sobre a capacidade de pensar da criança e do adolescente. Temos então, pequenos cidadãos que crescem anestesiados e incapacitados para discordar da situação presente e formular soluções criativas para um mundo melhor.

A alta tecnologia posta a serviço dos meios de comunicação, da mídia, completou a tarefa de domar e adequar as informações consoante os interesses das classes dominantes, em qualquer plano, em qualquer conjuntura, em qualquer lugar.

Basta ver o contraponto no exemplo citado da guerra contra o Afeganistão (que as redes ocidentais, mesmo sem provas, chamaram de "Guerra contra o Terror"); uma rede independente, do Catar, foi o bastante para desmascarar os chamados "bombardeios cirúrgicos", ou sejam, aqueles que atingem somente os alvos ditos militares.

Uma das alternativas que surge é a rede mundial de computadores, a "internet"., Só no Brasil hoje são 19 milhões de internautas.

Presta-se a ser um instrumento de difusão de informações à revelia das classes dominantes, cumpre o papel de guerrilha, da qual a palavra é a arma decisiva nos nossos dias.

E não é por outra razão que programas de espionagem da rede, dos internautas de todo o mundo, prosperam como tentativas de controlar e identificar eventuais adversários da ordem dominante.

Da mesma forma, timidamente, começa a ganhar corpo, como em tempos recentemente passados, a chamada imprensa alternativa. Tanto no setor de jornais e revistas, como nas rádios e televisões comunitárias (sob as quais as elites estendem seus tentáculos, também).

A globalização da linguagem padroniza os modos de falar, de pensar e ainda não se mediu a inteira repercussão disso. A necessidade de cada povo, cada grupo, manter a sua identidade histórica através do respeito à sua maneira de falar, de plantar, de cozinhas, de divertir-se no lazer, de vestir-se, de contar histórias aos filhos, etc, assim como a moeda e a bandeira, a linguagem é um elemento de identidade e soberania de um povo.

O desafio da comunicação é, talvez, o maior desafio que os movimentos populares enfrentam nos dias de hoje.

Perdê-lo equivale a permitir que o processo neo liberal e suas conseqüências consolidem-se.

Ganhá-lo é a alternativa para o mundo livre e democrático que desejamos.


II - O MUNDO DAS COMUNICAÇÕES E O PAPEL QUE EXERCE - A MÍDIA FORMAL

O mundo do capital não registra seus índices a partir de dados humanos. Mas de valores financeiros e econômicos. Qualquer cidadão, em qualquer canto do mundo, hoje, mesmo que não entenda absolutamente nada de mercado de capitais toma os índices das bolsas de valores como referência para definir se a situação está boa ou ruim.

Wall Street permeou a alma da pessoa mais simples do mais longínquo dos cantos. Se, as expedições arqueológicas de nosso tempo mergulham na terra, literalmente, encontrando restos de admiráveis civilizações, num tempo futuro, daqui a dois ou três mil anos, os arqueólogos irão espantar-se com a suntuosidade dos prédios das bolsas, das sedes dos bancos, das grandes corporações. É a marca de nossa época. Ao invés das esculturas de Fídias, os grandes conglomerados financeiros.

O cidadão comum saca o seu cartão de crédito, exibe-o como símbolo de quem é bem sucedido e transforma-o em fator de afirmação diante do outro. Há quem diga que a teoria freudiana vai substituir o pênis como elemento fundamental na construção das personalidades, pelo dinheiro de plástico.

O sanduíche embalado em caixa de papelão colorido, com brinquedos e atrações inúteis para crianças, vira rede mundial transforma-se em símbolo de uma época, da potência hegemônica. Cooptado pela necessidade de ser visto o cidadão não se importa que esteja comendo comida transgênica e que os resultados em sua saúde serão nocivos.

Celebra-se a vida, como se ela cingisse-se a um só dia e todos os dias são vividos como o último, no delírio do "Dow Jones".

O papel da mídia nesse processo é o maior, o mais decisivo. É ela quem mostra ao cidadão comum qual deve ser o seu procedimento diante de cada momento de sua vida, para estar inserido num contexto que nem ele própria saberia explicar, mas que se lhe parece fundamental.

O jornalista Bernardo Kurscinsky, em matéria publicada no jornal "Opinião", um dos principais combatentes contra a ditadura militar, mostrou o quanto a "coca cola" afetava o comportamento de determinadas comunidades no Peru. As pessoas, estimuladas pela necessidade de serem vistas com o refrigerante, substituíam o leite dos filhos pelo refrigerante. O dado apurado pela FAO - Organização para Alimentos - foi aterrador: os índices de subnutrição naquelas comunidades chegaram a níveis assustadores.

Era importante, mais que ter o filho saudável, passar pela praça da cidade com uma garrafa do líquido.

Na mesma região, quando da chegada do rádio transistorizado e, na mesma reportagem, os tijolos pintados como se rádios fossem e com antenas de arame, porque ter rádio era estar incluído. Não ter, significava exclusão.

A atriz Júlia Lemertz, sucesso nas novelas da Rede Globo, declarou há dias que sentiu-se constrangida num programa da animadora Xuxa, pois era quase que uma exigência, que chorasse à menção do nome de sua mãe, uma atriz de igual sucesso, Lilian Lemertz, falecida há anos.

O choro daqueles que têm suas vidas expostas ao público em programas como o da Xuxa, forma nossas crianças no dia de hoje. Tanto quanto os jogos de vídeo que ensinam a matar de forma asséptica e em salas fechadas, onde não se vê a destruição a morte com todas as suas terríveis cores.

É o Estado "Mad Max", mistura de "1984" com "Admirável Mundo Novo" e as sombrias previsões de Arnold Toynbee que, em seus últimos trabalhos, falava no fundamentalismo religioso como fator determinante de um possível novo mundo. Um mundo devastado.

E não pela guerra, pela hecatombe nuclear, mas pela exclusão deliberada sob o patrocínio do processo de globalização, na verdade, uma nova forma de colonialismo e opressão, conseqüência lógica, a partir da potência e grupos hegemônicos.

A mídia é isso. O fator externo e determinante, a face visível do bem sobre o mal, na ótica dos poderosos, das elites mundiais. Do sistema financeiro internacional.

A cura de todas as angústias e aflições servida em doses coloridas e multidiversificadas, com objetivos visíveis de dominação.

A transformação do homem em objeto. Em máquina.

Ou como costuma afirmar o jornalista Millôr Fernandes, "no fim dos tempos só serão ouvidos os computadores. Único registro de vida humana".

A concentração dos veículos de comunicação em todo o mundo (no Brasil é escandaloso o processo de concessão de canais de rádios e televisões), os grossos recursos colocados à disposição desses veículos, muitos deles com controle acionário de bancos e grandes corporações, mataram o jornalismo como atividade informativa, de debate, de denúncia, de construção da cidadania.

A exceção de uns poucos jornalistas independentes, mesmo assim nos jornais, os que menor público alcançam, a mídia é o grande regulador da vida a serviço da nova ordem. O mundo do deus mercado, das bolsas de valores.


III - A REDE MUNDIAL DE COMPUTADORES

No início do governo Clinton, um acordo entre zapatistas e o governo central do México pôs fim à ofensiva dos militares daquele país contra os índios e as populações pobres da região de Chiapas. A negociação foi estimulado, os Estados Unidos não queriam no Nafta (tratado comercial que une México, Canadá e EUA) problemas com movimentos populares. Ao contrário do estabelecido o presidente Lopes Mateo determinou que os militares avançassem sobre Chiapas, num domingo à tarde, numa tentativa de ofensiva fulminante, buscando posições que obrigassem aos zapatistas aceitar as condições oficiais.

As denúncias e os pedidos de socorro chegaram a todo o mundo, inclusive à Casa Branca, pela "internet", a rede mundial de computadores e a ofensiva foi suspensa. O fato foi amplamente noticiado pela mídia em todos os cantos do mundo.

A rede mundial de computadores possibilita um fato interessante: a fragmentação da informação. Cada um internauta é seu próprio formador. Cada internauta dispõe de instrumentos que o permitem acessar o outro lado do mundo e veicular informações segundo sua ótica.

Grupos de debates, de informação, home pages, sites, portais, uma nova realidade no mundo da comunicação e cada vez mais acessado, mesmo em países considerados miseráveis.

O poder da "internet" é espantoso em todos os sentidos. Comércio, indústria, relações inter países, humanas, comunicação e não é por outra razão que os donos da nova ordem buscam meios de controlá-la e impedir que transforme-se em poderoso instrumento de libertação, ou de formação, num futuro próximo, acessível a todos os homens e mulheres do Planeta. A "internet" é a alternativa ao pensamento único e assim, o caminho para a quebra do monopólio da informação em poder da mídia impressa, de rádio e televisão em nossos dias.

A "internet" é um instrumento de informação, formação e ação diante da globalização.

A "internet" é um veículo que faz do chamado mundo virtual uma perspectiva de mundo real, livre das deformações provocadas pela mídia e seus padrões de comportamento, de interesses, tanto quanto, por mais paradoxal que possa parecer, une pessoas, abre perspectivas concretas para a formação e a organização populares.

A "internet" é o desafio que temos que vencer, pois os olhos dos grandes já estão postos sobre ela e os mecanismos de controle ativados e ameaçam o que, por enquanto, na maioria dos países do mundo, é um portal de liberdade.


IV - A MÍDIA BRASILEIRA

A história da mídia brasileira é a história dos desafios vencidos nas grandes lutas do País, desde o período imediatamente anterior à independência. A luta pela própria independência. As denúncias contra o caráter absolutista de Pedro I. A luta pela maioridade de d. Pedro II. A luta pela abolição da escravatura e a luta pela proclamação da República.

Os primeiros veículos de comunicação, jornais, refletiam o pensamento liberal clássico, eivados do positivismo, isso a partir da proclamação da República. A mídia, num contexto diverso, era contestadora, panfletária, mas ainda assim, dela valiam-se as elites. O primeiro jornal popular surge na década de 20, "O Trabalho", na cidade mineira de Juiz de Fora (in "Comunistas e Anarquistas no Brasil - 1900_1930", John W. F Dulles, ed. Nova Fronteira, 1973, segunda edição revista e ampliada).

De lá para cá, observador sempre o tempo histórico, o contexto de espaço, a mídia vem transformando-se gradativamente, em instrumento das classes dominantes e hoje reflete o quadro que observa-se em todos os países do mundo: fator de dominação.

A censura, velada ou não, sempre foi um fator constante. Seja, nos interesses das classes dominantes, seja no DIP - Departamento de Imprensa e Propaganda - da ditadura Vargas, ou no período militar, com a censura prévia estabelecida e prevista em documentos básicos do tempo do arbítrio.

Um breve espaço durante a vigência da constituição liberal de 1946, sobretudo no governo Juscelino Kubistchek. Mas, aí, a mídia começa a tomar outros contornos, pois acentuada a influência do rádio, surgindo a televisão e seu extraordinário poder e as empresas jornalísticas de grande porte em mãos de setores conservadores, é, na verdade, o embrião do que vemos hoje: um mercado concentrado, difundindo e divulgando informações do modo oficial de pensar, asfixiando pequenos veículos comunitários e comprometidos com a informação sem peias ou censuras. A discussão sobre a mídia brasileira, seu papel, suas origens, sua estrutura e principalmente suas fontes financeiras é um painel para discussões que se apresenta como essencial para qualquer pretensão de oficina capaz de abrir perspectivas de novos caminhos.


V - PROPOSTA DE OFICINA

A proposta de uma oficina no Fórum Social Mundial com o título "A Internet e a Informação num Mundo Globalizado", tem como escopo provocar esse debate sobre a mídia de um modo geral. Suas alternativas, seus caminhos, as possibilidades da luta popular por um mundo democrático, justo, fraterno, a partir da informação como fator de formação e organização.

Assim, são propostas básicas:

- painéis demonstrativos da aliança elites/mídia;
- debates e palestras sobre o papel da mídia, suas perspectivas, seu quadro atual e as formas de mídia alternativa;
- o papel da "internet" no processo de conscientização, formação e organização na resistência ao capital a partir da visão dos países e grupos hegemônicos;
- a estrutura legal da mídia brasileira, seus vícios, seu poder, suas alianças;
- a mídia e o processo eleitoral;
- a notícia como fator de dominação;
- as rádios e tevês comunitárias, o que pode e deve ser feito para preservar a integridade popular desses veículos e,
- a guerra da comunicação: o que é informação isenta e formadora.

E, que podem ser sintetizadas nos seguintes grupos:

I - Mídia formal;
1) - Mídia brasileira;
2) - Estrutura e origens e fontes financeiras da mídia, comprometimento e aliança entre elites e mídia;
3) - Telecomunicação e internet e
4) - Objetivos e utilização da mídia formal:
- a notícia como fator de dominação;
- o processo eleitoral
- a guerra da comunicação;
- homogeneização e formação de mercado consumidor, valorização da identificação com bens e linguagem internacionais - anestesiamento do senso crítico individual.

5) - Mídia Formal Independente:

- exemplo do Le Monde Diplomatique;
- exemplo do Le Canard Enchainé;
- exemplo das tevês do Irã, da China e da rede do Catar;
- retrospecto de jornais independentes no Brasil - "Pasquim", "Opinião", "Movimento", "Coojornal", revista "Pif Paf", etc.

II - Possíveis soluções e um plano para um país que queremos nosso:

1) mídia alternativa e independente;
2) radioamadores e rádios a corda;
3) rádios e tevês comunitárias;
4) internet sem controle - as redes horizontais;
5) o que fazer para preservar os espaços e a integridade da informação;
6) como mobilizar as pessoas e conscientizá-las do problema;
7) como formar audiência crítica entre o público infantil e jovem e 8) como valorizar a língua, a cultura, a identidade nacional - cidadanias e soberania.


V - CONCLUSÃO

O tema ora proposto é de suma relevância para as forças que lutam contra o mundo dominado a partir do capital sem peias, sem limites, escravagista e gerador de exclusão social deliberada. O enfoque não pode restringir-se às fronteiras do Brasil, mas atinge a todo os países e povos.

O Fórum Social Mundial é antes de tudo o aglutinador da resistência organizada, ordenada e portanto, o ideal para o debate de um dos mais instigantes temas e desafios da atualidade, do ponto de vista das classes dominadas.

O objetivo dessa proposta de Oficina é o de abrir o debate em torno de algo decisivo, sem pretender esgotá-lo, mas abrir uma picada que se pretende conseqüente e capaz de produzir efeitos e caminhos alternativos para a "revolução da palavra".



Portada | Iberoamérica | Internacional | Derechos Humanos | Cultura | Ecología | Economía | Sociedad | Ciencia y tecnología | Directorio | Redacción