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13 de abril de 2002 |
Venezuela
Abandonado, Chávez sucumbiu ao lobby
Emir Sader
Hugo Chávez triunfou eleitoralmente e colocou em prática um programa nacionalista. Mas não conseguiu constituir na Venezuela uma nova opinião pública, que o sustentasse diante da pressão da imprensa e do empresariado.
O velho preceito vale para a direita e para a esquerda: pode-se fazer tudo com uma baioneta, menos sentar em cima. Em outras palavras, a baioneta é necessária para que um poder se mantenha, mas é insuficiente. Hugo Chávez ascendeu ao governo legitimamente, com amplo apoio popular, culpando, com razão, a elite tradicional, representada politicamente pelos partidos Ação Democrática e Copei - a social democracia e a democracia cristã - pelo debacle do país. Uma elite que fez a "farra do petróleo", valendo-se dos royalties para seu enriquecimento pessoal e como classe, sem que a Venezuela tivesse reconvertido minimamente sua economia para a industrialização ou para outros setores que fizessem com que o país deixasse de viver somente às custas do petróleo. Hugo Chávez triunfou eleitoralmente, obedeceu a todos os preceitos da democracia liberal, com eleições, plebiscitos, maioria parlamentar etc. Colocou em prática um programa nacionalista em termos petrolíferos e utilizou os recursos da exportação basicamente para políticas sociais. Teve 70% do voto popular, sendo vigorosamente rejeitados pelas elites, tanto econômica quanto dos meios de comunicação. Aliás, a imprensa exerceu todo o seu poder, de forma unânime, contra o governo. Chávez se sustentou em seu carisma pessoal, nesse apoio popular inicial e na recuperação dos preços do petróleo - para o que contribuiu substancialmente seu governo, ao propor novas diretrizes à Opep. Porém, não organizou seu apoio popular e não conseguiu constituir uma nova opinião pública. Foi cercado desde o começo pela grande imprensa da oposição. Seus pontos de vista eram defendidos praticamente apenas por ele, em transmissões de rádio e televisão do governo. A oposição, fortemente apoiada pelo governo dos EUA, foi minando sua popularidade, com boicote econômico, fuga de capitais, monopólio da imprensa, valendo-se do apoio institucional que os velhos partidos ainda tinham, especialmente em setores da burocracia sindical. Essa ação desestabilizadora combinou mobilizações populares - que aumentaram especialmente quando os preços do petróleo baixaram, os recursos governamentais diminuíram e os efeitos do boicote econômico e financeiro foram se sentindo de maneira mais clara -, com a insubordinação de oficiais das Forças Armadas e a desestabilização da empresa estatal de petróleo, que fornece os recursos essenciais para o funcionamento econômico do país. Confiando na legitimidade institucional que o cumprimento dos preceitos liberais lhe proporcionava, Chávez acreditou que poderia enfrentar os conflitos e as dissensões - que passaram a surgir na sua própria base de apoio, conforme a situação passou a se deteriorar. O presidente endureceu as respostas do governo, sem se dar conta da mudança da correlação de forças - como a força militar. Acreditou em excesso na legitimidade formal e na coesão das Forças Armadas. Foi se enfraquecendo aceleradamente desde a primeira greve geral, de dezembro do ano passado. Seu projeto fracassava, conforme não conseguia organizar suas bases populares de apoio e conforme via debilitar seu apoio nas Forças Armadas e na empresa venezuelana de petróleo. A combinação desses elementos acabou levando ao fim da experiência venezuelana de governo nacionalista, com forte cunho militar, ainda que com legitimidade institucional. O que demonstra que a força das armas é necessária para a manutenção de qualquer governo, mas também é insuficiente. É necessário construir um projeto com capacidade hegemônica, que possa galvanizar as grandes maiorias do país, possibilitar sua organização como sujeitos sociais e políticos dos processos históricos, dos quais os governos, civis ou militares, sejam instrumentos. Do contrário, o governo perde densidade social e termina por se esvaziar, facilitando sua derrubada. Neste caso, derrubada pela direita tradicional, apoiada nas Forças Armadas e nas reações corporativas do sindicalismo conservador. A democracia liberal demonstra suas limitações, assim como projetos bonapartistas que, embora com programas nacionais e populares definidos, não consigam mobilizar a massa da população, tentando apenas apoiar-se nela, sem lhe dar o protagonismo social e político. |
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