Portada | Directorio | Buscador | Álbum | Redacción | Correo |
13 de abril de 2002 |
Venezuela O golpe do capital
Laerte Braga
A queda de Hugo Chaves era previsível. E por vários fatores, inclusive
o próprio presidente da Venezuela. Uma liderança meramente pessoal, sem
qualquer sustentação mais profunda junto aos movimentos populares do seu
país. Mas foi golpe de estado. Nada além de golpe de estado. E anunciado
nas advertências e nos alertas de George Bush sobre suas "preocupações"
com a democracia venezuelana.
A nota do Departamento de Estado norteamericano afirmando que espera um breve retorno a democracia é típica e já foi respondida pelo empresário/gerente, qualquer coisa Carmona: fechou o Congresso e a Suprema Corte. O golpe mostra que os militares não mudaram nada. Continuam acreditando-se intérpretes da lei, da ordem, da pátria, de Deus, da família, tudo o que serve aos interesses do capital. É um viés nacionalista que vivem a proclamar mas que, na hora agá, faz com que as forças armadas de países latino-americanos virem uma espécie de gendarmaria dos Estados Unidos. Chaves criou as condições necessárias para sua derrubada. Sem ser um líder popular, mas produto de uma indignação que permeava todos os venezuelanos, construiu uma história de coragem pessoal, de destemor, virou algo como protetor dos despossuídos com um discurso nacionalista e uma prática confusa, reformista, por isso mesmo vacilante. Não conduziu uma revolução como dizia, mas um arroto revolucionário, para, logo em seguida, mergulhar nas contradições do reformismo. Que são, tais contradições, mais ou menos como "ser ou não ser". Acabou res. O ideal de revolução bolivariana só existia na cabeça dele. Acreditou em sindicatos (Saramago os definiu bem na mensagem lida ao final do Fórum Social Mundial: corporações, só isso). Imaginou-se o grande condutor de seu povo, guia, messias e não organizou coisa alguma. Os prejuízos causados à classe trabalhadora venezuelana estão para além disso, no entanto. São uma dolorosa lição e devem repercutir em todo a América Latina. Um retrocesso previsto, um final patético. Serve de lição para as esquerdas de todo o continente. Mostra que estão ressurretas as atividades golpistas da CIA. Se é que estiveram, algum dia, enterradas. Desmistificam a crença que as forças armadas, como um todo, como instituição, defendem algo diferente do que defendiam na década de 60, quando fomos inundados de golpes semelhantes: Brasil, Chile, Argentina, Uruguai, etc, etc, etc. A Venezuela é o quarto maior produtor de petróleo do mundo, o segundo dentre os que países que exportam para o império norte-americano. Sob Bush é com areia. Vaselina está fora de cogitação. E isso no mundo inteiro. É só ver o que Colin Powell falou antes de viajar para o Oriente Médio e o que está falando depois do encontro com herr Sharon. Ou você é um Fernando Henrique da vida. Vive de quatro, com as pernas abertas aos donos do mundo. Ou mesmo que seja um Hugo Chaves e não um Fidel, vai ser varrido. É a lógica da segurança nacional (a dos Estados Unidos) de volta. O velho efeito dominó dos tempos de Kissinger: se cair um, caem todos. Assim, que caia Chaves. Há aspectos claros a indicarem isso. O fato dos militares terem entregue o poder a uma junta presidida pelo presidente da maior associação empresarial do país. O apoio dos trabalhadores da empresa petrolífera - o caráter corporativo de trabalhadores com ganhos privilegiados -, a turma que gosta de negociar direto com a Volkswagen, como fizeram por aqui, no Brasil. A percepção clara que o que aconteceu na Venezuela, a derrubada de um governo legítimo, eleito pelo voto - e confirmado - faz parte de um processo que hoje atinge todos os cantos do mundo. Desde o que Bush elegeu como eixo do mal (Coréia do Norte, Iraque, Irã e Líbia), até países (governos) normalmente subservientes. Deve servir para abrir os olhos dos que têm posturas reformistas. A tentativa de vir a ser cópia melhorada do neo liberalismo que permeia toda a América Latina. Não funciona. Os olhos do capital não piscam. São implacáveis. Qualquer jornalista com um pouco mais de experiência e minimamente bem informado sabia que estava em curso um golpe militar na Venezuela. Como sabiam governantes dos países latino-americanos. Nem uma voz oficial para protestar contra a queda de Chaves. Foram avisados por Washington e "elogiados" por não serem como ele. Mas serem dóceis. Compráveis. Há um outro detalhe significativo em tudo isso: a questão Argentina. Determinados setores da esquerda começaram a acreditar que havia um processo revolucionário espontâneo no país portenho. Nada disso. Nenhuma revolução acontece sem que por detrás delas estejam bases de trabalhadores. Não existe mais essa história de grande guia. De pai dos pobres. Foi o que Chaves tentou ser. A rede oficial brasileira, "Globo", foi sintomática nos comentários da robô Fátima Bernardes, uma das apresentadoras, na edição do "Jornal Oficial", que alguns chamam de "Jornal Nacional": "que o fato sirva de lição para brasileiros em ano eleitoral, alertando-os para candidatos que fazem promessas que não vão poder cumprir". FHC entrou a seguir, tudo montadinho, certinho, bonitinho. Não precisamos de um Chaves e nem vamos a lugar nenhum com um Chaves. A luta de resistência passa por organização e formação. Por alicerçar-se nos movimentos operários e camponeses. E, em relação aos operários, passa por sacudir sindicatos, federações e confederações, tirando-os do marasmo e da posição subalterna de corporações defendendo corporações de trabalhadores privilegiados no todo. Uma última consideração: a nota do PT - Partido dos Trabalhadores - assinada pelo deputado Aluísio Mercadante, um dos gurus de Lula, está perfeita. Define tudo o que aconteceu na Venezuela. Só espero que Lula tenha entendido que virar presidente por vontade pessoal, essa história de "minha última chance", "a Globo tem direito a pedir dinheiro no BNDES" e "sou contra invasões", não vai levar a lugar nenhum e Lula não é nenhum Chaves. Tem história. Precisa recuperá-la e o momento é de reflexão. De retomar a luta popular. O golpe das elites e das forças armadas venezuelanas foi o golpe do capital. Insensato, ébrio e brutal, sob a égide de George Bush, o louco. |
||