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La insignia
30 de setembro de 2002


Brasil

FMI e investidores criam fantasias sobre Lula


__Especial__
Brasil: Eleições 2002
Kenneth Maxwell (*)
Linha Aberta. Brasil, setembro de 2002.



Na América Latina, o "realismo mágico" reduziu-se a uma moda literária. Mas quando a questão é o Brasil, a fantasia reina suprema entre burocratas do FMI e investidores de Wall Street. De que outra forma pode-se explicar a demonização de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à Presidência pelo Partido dos Trabalhadores? Ou o ridículo "lulômetro" inventado pela Goldman Sachs em junho último para prever o valor da moeda brasileira de acordo com sua posição nas pesquisas eleitorais?

O "lulômetro" foi, graças a Deus, trancado em algum lugar longe das vistas do público. Mas onde quer que esteja, deve estar pulsando furiosamente. A praticamente uma semana do primeiro turno, Lula está muito próximo da vitória. José Serra, o candidato do governo -que continua a ser o favorito de Wall Street-, definha a uma distância de 25 pontos atrás de Lula. E Anthony Garotinho, o ex-governador do Rio de Janeiro, pode até mesmo atrapalhar a chance de Serra de ir para o segundo turno.

Serra fez uma campanha negativa, o que não o ajudou até agora nas pesquisas. Mas ela foi bem sucedida em eliminar dois de seus rivais. Se Serra chegar ao segundo turno, ele tentará destruir a imagem de um moderado e afável Lula. Para isso, usará imagens das "velhas" e radicais reuniões com Hugo Chávez, o volúvel presidente da Venezuela, e com o líder cubano Fidel Castro.

Mas apesar das bandeiras e estrelas vermelhas do PT de Lula, alguém deveria dizer a Wall Street e ao FMI que a guerra fria acabou há tempos. Na verdade, eles devem rezar para que Lula vença as eleições logo no próximo domingo. Com o real em queda livre, a última coisa que o Brasil e o sistema financeiro internacional precisam é de um prolongamento da campanha até o segundo turno, no dia 27 de outubro. Esta é a última coisa que o FMI, que forneceu um pacote de US$ 30 bilhões como ajuda ao Brasil, deveria esperar.

Um sólido apoio do público é fundamental para qualquer presidente brasileiro, e uma campanha negativa implacável vai apenas enfraquecer a capacidade de qualquer um dos candidatos a governar efetivamente em 2003.

A verdade é que a vulnerabilidade da moeda brasileira foi criada sob orientação do FMI. As taxas de risco saltam em momentos de incertezas eleitorais e numa enfraquecida economia global, aumentando o risco de aversão entre investidores.

Nesses circunstâncias, o pagamento de juros vinculado ao valor do real ou indexado pelo dólar é intolerável, mesmo se o Brasil mantiver um superávit primário de 3,75%. Culpar Lula por tudo isso é ridículo.

Esta é a quarta eleição à Presidência a que Lula concorre. Ele e o PT aprenderam com as derrotas passadas. O PT passou a última década modernizando sua ideologia e movendo-se em direção ao centro político. Durante 20 anos, membros do partido foram sendo eleitos para cargos municipais e estaduais. Eles sabem que uma administração eficiente e honesta é mais importante que um partidarismo agudo. Silenciosamente, o PT formou alianças com outros partidos e, durante a campanha, tranquilizou os militares.

O partido também mantém uma ligação com o presidente Fernando Henrique Cardoso. Se Lula realmente vencer no primeiro turno, FHC está propenso a garantir uma transição calma e a trabalhar junto com Lula para lidar com a crise financeira. É interesse de FHC fazê-lo, já que ele não quer deixar o Palácio do Planalto no meio de um desmanche econômico, com sua reputação de estadista destruída. O governo Lula também deve ter mais ou menos o mesmo apoio de uma coalizão sólida de centro-esquerda no Congresso, como ocorreria em um governo Serra. Analistas de Wall Street e burocratas do FMI deveriam deixar a política brasileira para seus 115 milhões de eleitores e parar de confundir fato com fantasia.


(*) Kenneth Maxwell é historiador inglês, autor de, entre outros, "A Devassa da Devassa" e "Marquês de Pombal" (ambos pela ed. Paz e Terra), e membro do Council on Foreign Relations de Nova York.

Este artigo foi publicado pelo jornal "Financial Times" em 26 de setembro de 2002



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